‘Momento é grave, mas não se faz política negando a política’, diz Marina, em meio à ‘onda Doria’
DANIELA LIMA
EDITORA DO PAINEL
Derrotada nas eleições de 2014 ainda no primeiro turno, a ex-senadora Marina Silva (Rede-AC) é apontada hoje como uma “sobrevivente”. Seus dois principais adversários na disputa pela Presidência, Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB), foram arrastados para o centro da Lava Jato por delatores da Odebrecht.
Sem citação no caso, Marina diz que o país vive um “de seus piores momentos desde que reconquistou a democracia”. Ela espera que a crise tenha “um aspecto pedagógico” e fala firme contra a ascensão de salvadores da pátria no país.
Sem citar nomes, a ex-senadora diz que há alas “ansiosas, que acabam caindo na fabricação de lideranças políticas”. “Boa parte dos empresários fabricados com dinheiro do BNDES não deu certo. Políticos fabricados também têm uma boa chance de não darem.”
“Não se faz política negando a política. Você pode criticar. A política está impotente, precisa se reinventar, mas a melhor forma de fazer isso é com base na verdade. A gente deveria aprender com o que está acontecendo aí. Algumas pessoas ficam ansiosas e acabam caindo na fabricação de lideranças. O político, ele vai se forjando”, afirma.
A crítica de Marina acontece no momento em que, com diversos líderes fortemente comprometidos pela Lava Jato, integrantes do PSDB apontam o prefeito de São Paulo, João Doria, como potencial presidenciável. Ele se elegeu no ano passado, em primeiro turno, com o discurso de que era um gestor, e não um político.
Em entrevista à Folha, a ex-senadora diz que, no cenário de hoje, o “único caminho é o da lei, o da Constituição” e cobra uma atuação da Justiça Eleitoral. Para ela, os desdobramentos da Lava Jato mostram que houve “um golpe na democracia”.
“As eleições não foram justas. Elas foram fraudadas. O prejuízo do chamado caixa dois, ou do que quer que seja, é maior. É uma fraude na nossa democracia. Mostra que um grupo se reuniu para golpeá-la de morte”.
A Rede defende a cassação da chapa no TSE (Tribunal Superior Eleitoral). A ex-senadora também condena o discurso de que é preciso manter o governo Michel Temer sob pena de fragilizar ainda mais a economia do país.
“Não haverá estabilidade econômica ou política, e nem se deve desejar tal estabilidade, à custa dessa corrupção institucionalizada e sistêmica.”
“Essas pessoas não são vítimas do sistema. Ao contrário, elas o fraudaram”, diz Marina.
Alçada à linha de frente da disputa presidencial após a morte de seu companheiro de chapa, o ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos (PSB), Marina diz que “ninguém é, a priori, culpado ou inocente”.
Campos é citado como um dos destinatários de recursos da Odebrecht. “Ele está morto e não está aqui para se defender. O caminho é confiar na investigação, fazê-la com rigor.”
Apontada nos bastidores como uma estimuladora da entrada de figuras que ocuparam o primeiro escalão do poder Judiciário na política, Marina não nega o movimento. Ao contrário. Diz que, se há espaço para esse tipo de interação, é porque a política tradicional “falhou”. “Quem empurra as pessoas do mundo da Justiça ou da polícia para a política são os maus políticos.”
Aliados da ex-senadora apontam os ex-ministros Carlos Ayres Britto e Joaquim Barbosa, ambos do STF (Supremo Tribunal Federal), como figuras próximas a ela, que poderiam ser convidados a disputar a eleição, ao seu lado, em 2018. Marina, porém, não quer antecipar nenhum movimento sobre a próxima corrida ao Planalto.
Segundo ela, “estamos assim porque as pessoas só pensam em eleição”. “Se elegem e fazem cálculos sobre quanto tempo vão ficar no poder.”