Dilma muda rotina e desabafa com auxiliares após anúncio de Cunha

Painel

Com que roupa Dilma Rousseff discutia a votação da nova meta fiscal. Como se percebesse algo ruim no ar, preferiu não almoçar em casa, decisão rara desde que a mãe ficou doente. Tudo indicava que o dia terminaria bem. Até Eduardo Cunha surgir na TV. Após minutos reflexiva, rompeu o silêncio. “Vou falar hoje”, disse, ordenando que um assessor buscasse no Alvorada a muda de roupa que usaria no pronunciamento. Na volta, desabafou: “Todos conhecem meus defeitos. Sabem que não sou ladra”.

Já deu Depois de escrever, com auxílio de alguns ministros, seu discurso de defesa de próprio punho, a presidente ligou para o vice Michel Temer: “Não podia mais ficar sob chantagem”, afirmou.

Apoio moral Lula telefonou para manifestar apoio enquanto a sucessora rascunhava o discurso. Tão logo retornou a seu gabinete após o pronunciamento, assessores e congressistas que a visitavam puxaram uma salva de palmas para a petista.

Apatia Temer soube da decisão por intermédio de Eduardo Cunha. A conversa durou alguns segundos. O vice não esboçou reação.

Deixa estar Temer, por ora, adotará postura de “recolhimento total”. Além de evitar ligação com a decisão do correligionário, o vice vai esperar para ver como o setor privado e o mercado financeiro amanhecerão.

Retiro Sentado em sua cadeira, Cunha pediu que todos os assessores e aliados se retirassem de seu gabinete antes de anunciar a abertura do processo de deposição. Passou um tempo sozinho até sair para a entrevista.

Conectado Quatorze minutos antes do anúncio, um importante auxiliar palaciano dizia que o governo não acreditava na possibilidade de o impeachment ser deflagrado.

Tática O Planalto deve apresentar um recurso ao plenário da Câmara contra a decisão de Cunha. Como este deve rejeitá-lo, o governo, então, recorrerá ao Supremo. Tentará, ainda, matar o processo na comissão especial. “Se for adiante, o risco é muito alto”, avalia o Executivo.

Ao ataque Mesmo sem apoiar 100% o governo Dilma, movimentos sociais chamaram reunião de emergência nesta quinta-feira. Dizem que a “chantagem” feita por Cunha os levará às ruas.

Filho pródigo Os bastidores do impeachment revelam que a oposição se reconciliou com Cunha nos momentos derradeiros da abertura. Emissários do presidente estiveram com líderes do PSDB e do DEM.

‌Muita fé Ao ser informado sobre a definição do PT de votar contra o peemedebista no Conselho de Ética —antes, portanto, de Cunha formalizar o impeachment— Mendonça Filho (DEM-PE) levantou as mãos ao céu e soltou um aliviado “graças a Deus”.

Sem remorso Antes da coletiva, Cunha afirmou: “Sempre fui adversário do PT. Isso não muda nada. O PT só defende os seus presos, não os adversários”. Depois do anúncio, disse que dormiria “tranquilo, como sempre”.

Vale? O deputado Zé Geraldo não se conformava com a decisão petista no conselho que levou à abertura do impeachment. “O Rui Falcão contribuiu para isso em nome da ética. Mas é ético cassar uma presidente ética?”

Ah, tá Presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto diz que o processo dará “boa oportunidade para debater o que está em discussão para o país”. “Não tem guerra, tem debate de projeto político.”

Visita à Folha Os advogados Roberto Teixeira, Cristiano Zanin Martins e Valeska Zanin Teixeira Martins, do escritório Teixeira Martins, que representa o ex-presidente Lula e seu filho Luís Cláudio, visitaram ontem a Folha. Estavam acompanhados de Iris Walquiria Campos, sócia-diretora da IW Comunicações.


TIROTEIO

Não dá para aguentar mais. Vamos resolver, é melhor para o Brasil. A tendência é que a decisão seja uma espécie de plebiscito.

DO SENADOR JOSÉ SERRA (PSDB-SP), sobre o tipo de decisão que o Congresso tomará com a tramitação do pedido de impeachment de Dilma Rousseff.


CONTRAPONTO

Planeta Terra chamando

Enquanto o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) anunciava, em entrevista coletiva, nesta quarta, na Câmara dos Deputados, a deflagração do processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff, uma reunião no Palácio do Planalto, com integrantes do baixo escalão do governo, discutia a Olimpíada do Rio.

Um dos participantes interrompeu a discussão sobre a tocha olímpica para dar a notícia:

—Gente, vocês estão sabendo que o Cunha acaba de acatar o pedido de impeachment?

Todos se entreolharam, ficaram em silêncio e seguiram a reunião como se nada tivesse acontecido.